O galã do cemitério

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GVM Out19

A Vila Madalena, como todos sabem acolheu estudantes da USP e jovens de várias cidades do Brasil. E aí é que surgem também estórias, lendas e personagens característicos e misteriosos. Um dos moradores antigos da Vila é o Mouzar Benedito, escritor, jornalista, geógrafo, meu parceiro numa cachacinha mineira, chegou aqui aos 16 anos, vindo de Nova Resende (MG) e hoje faz parte da Sociedade de Observadores de Saci.

Um catarinense recém-chegado na Vila, logo ficou amigo do Mouzar. Juntos estudaram no colégio Castro Alves, na Teodoro Sampaio, onde hoje é o Objetivo. Tipo franzino, alto, magro, topete com brilhantina e um bigodinho aparado que lembrava Rodolfo Valentino dos anos setenta.

Repetia sempre aos domingos um programa inusitado e solitário que não contava a ninguém. Até que um dia descobrimos tal faceta. Caprichava no perfume e no laço lateral do lenço de seda no pescoço, paletó alinhado, calça tergal boca sino e de sapato lustroso andando como o Zé Bonitinho, nosso galã seguia em direção ao Cemitério São Paulo. Rondava as ruas internas pelos túmulos. Apanhava por lá mesmo uma rosa. Quando entrava alguma mulher de preto ou por lá já estivesse diante de um jazigo supondo ser a viúva e por tal estaria a jovem senhora ou nem sempre jovem, carente de sexo. Chegava como quem queria rezar pelo falecido e a abordagem se iniciava entregando a rosa.

Enquanto eu, Mouzar, Mineiro, Jura, o garçom Piauí e quem mais estivesse em nossa mesa no Sujinho da Mourato Coelho tomando cerveja, batendo papo, víamos passar o Galã Barriga-Verde, quase sempre nestes domingos, acompanhado num taxi-mirim descendo a Wisard com um sorriso entre fúnebre e libidinoso rumo à marginal, como dizia nosso amigo Zeca Bahia: “Foram se daná nos amô”.

pedrocosta.pira@uol.com.br

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