O advogado Marcio Rachkorsky é especialista em direito imobiliário e se tornou conhecido do público através dos quadros “Chame o Síndico” e “Reunião de Condomínio” do programa Fantástico, onde cria soluções para que as pessoas possam conviver melhor nos condomínios. Formado pela PUC (SP), o Dr. Condomínio, como ficou conhecido, tem uma coluna na Rádio CBN, “Condomínio Legal”, e presta atendimento semanal no SPTV sobre o mesmo tema. Morador da Lapa desde o nascimento, ele tem seu escritório próximo ao metrô Vila Madalena e presta assessoria jurídica para mais de 500 condomínios. Nesta entrevista, ele fala dos problemas mais comuns de um condomínio e dá dicas de como resolvê-los.
Quantos condomínios têm em São Paulo?
Cerca de 30 mil, que empregam cerca de 400 mil trabalhadores e movimentam R$ 10 bilhões, enquanto o IPTU arrecadado pela prefeitura chega a R$ 8 bilhões.
Quais são os principais problemas de um condomínio?
Antes era inadimplência e vazamentos. Hoje, além deles, temos problemas seriíssimos com garagem, barulho, crianças, cachorros, salão de festas, segurança, individualização de uso de água e gás e muitos outros. O leque vai aumentando…
As brigas de moradores têm aumentado?
Muito. Primeiro porque muita gente migrou de casas para condomínios e não se preparou para viver a nova realidade. Tanto eles como seus filhos.
Qual é o segredo para se viver em condomínio?
É o diálogo, a conversa. Barulho, por exemplo. Em vez de reclamar na portaria ou pedir para o síndico multar, antes, procure seu vizinho e converse com ele. Pessoalmente ou por interfone, e explique seu problema ao vizinho. Geralmente funciona.
E se a conversa não funcionar?
Para quem não tem respeito pelo próximo, é hora de agir. São dois tipos de ação. Se a conversa não deu resultado, o condomínio pode ajudar o morador incomodado. O síndico ciente do problema pode mandar uma advertência, uma multa e até caracterizar o morador barulhento como antissocial, que é aquele morador que reiteradamente descumpre as regras. Ele pode ser multado em até dez cotas do valor do condomínio.
E o outro tipo de ação?
Quando a coisa foge ao controle, o morador deve notificar, através de carta, o morador para que este pare com esse ato lesivo. Se não surtir efeito, pode abrir até um inquérito policial. O infrator está cometendo um crime de perturbação do sossego alheio. E pode ser condenado em um processo criminal.
Explique o que vem a ser um morador antissocial.
É um conceito subjetivo. Apareceu em 2003, no atual Código Civil. Mas o legislador não definiu o que seria. Por definição, é aquele morador que reiteradamente descumpre as normas e as leis e não permite uma convivência harmoniosa. É aquele que estaciona seu carro fora da vaga e não está nem aí. Leva convidados à piscina, embora o regulamento não permita. Deixa o som alto e não liga mesmo com as reclamações dos outros moradores… Ele incomoda os vizinhos habitualmente.
Em matéria de barulho, o que incomoda mais?
O que é rotineiro. Temos um potencial enorme de criar barulhos. O liquidificador logo pela manhã, o secador de cabelo, as mulheres que usam sapatos de salto. Quem tem cachorro, antes de sair, precisa verificar se ele tem água e ração. É comum deixarem os pets na varanda e o animal latir o dia inteiro, atormentando à vizinhança. Quem tem hidromassagem deve evitar usá-la de madrugada, por conta do motor.
Os prédios não são construídos adequadamente?
Critico muito esses grandes empreendimentos. São concebidos para receber uma grande população, bons espaços, mas não têm isolamento acústico para economizar na construção. Falta atenção e cuidado por parte das construtoras. Nos apartamentos e nas áreas comuns, como salão de festas.
Os salões de festas geram muita reclamação?
Os moradores precisam saber que festa em condomínio se assemelha às reuniões. Baladas e festas devem ser feitas em outro lugar. Mas os condomínios podem limitar o número de convidados, determinar horário de início e fim. O regulamento interno precisa ser bem redigido.
Qual a razão das assembleias de condomínios serem desprezadas?
Elas são importantes. Tanto as gerais como as extraordinárias, nas que têm muita baixaria e lavação de roupa suja entre os moradores. É na assembleia que se decide o que vai acontecer durante o ano inteiro e geralmente atinge o bolso dos moradores. Apesar de serem um pouco chatas, vale a pena comparecer. É um papel de cidadão.
Como deixá-las mais atraentes?
Determinar o tempo de início e fim é bom. O síndico que tem administração transparente já evita polêmica. Se ele disponibiliza as informações e as contas e descentraliza o poder, as reuniões são mais tranquilas.
E além disso?
Se o presidente da assembleia for um morador que conheça o condomínio e tem perfil conciliador, ajuda muito. Quando a reunião é rápida, com resoluções inteligentes e sem briga, na próxima, os moradores comparecem.
Quanto tempo um síndico deve ficar no comando?
O cargo muitas vezes encanta as pessoas só pelo poder. O rodízio é interessante. É sempre bom ter gente com ideias novas. Por exemplo, uma pessoa ter inúmeras procurações em uma assembleia deve ser evitada. Mas para alterar a Convenção do condomínio é preciso ter a aprovação de 2/3 dos moradores.
O que pensa sobre os síndicos?
Sou um defensor deles. Deveriam receber salário. Têm responsabilidade legal na esfera civil, criminal, tributária, trabalhista e previdenciária e respondem por tudo o que acontece no condomínio. Chamo o síndico de pacificador social. Cuida do dinheiro e do dia a dia dos moradores e não tem uma valorização.
E os síndicos profissionais. São indicados em que situação?
Atuo como síndico profissional para alguns condomínios. Em prédios comerciais, funcionam bem. Em prédios residenciais, com até 100 apartamentos, eu não recomendo. Os maiores precisam além dele, de uma boa equipe de apoio – administradora, zeladores, departamento jurídico, para funcionar bem.
E os pets?
A cada dia, cresce o número deles nos condomínios. É preciso que os moradores escolham os animais de acordo com o tamanho de seu apartamento. Os condomínios não podem proibir os moradores de ter pets. O que se costuma fazer é determinar o tamanho que pode e determinar as obrigações do morador com seu animal. Por exemplo, uso de elevador.
Uso de áreas de lazer por visitantes causa reclamação?
Depende do que está escrito na convenção. Morador tem direito de utilizar todas as áreas do condomínio. Visitantes, normalmente, não. Hóspedes geralmente ficam um tempo morando no prédio e podem. Basta o morador informar ao condomínio.
As convenções precisam ser tão rígidas, pouco democráticas?
Nos condomínios novos, a construtora entrega o prédio com uma convenção-padrão. Com o uso do condomínio, os moradores podem alterar o que julgar necessário. Mas, em geral, os moradores têm poucos direitos e uma infinidade de obrigações e, pior, de penalidades.
E a segurança?
Segurança não combina com conforto. O morador precisa entender que a segurança depende também dele. Não adianta equipar e preparar funcionários se ele não colabora. O porteiro não é um agente de segurança.
E quando os moradores utilizam os funcionários do condomínio para serviços particulares?
Não pode. Eles estão lá para servir ao condomínio. E o que é mais grave é o risco trabalhista. Se o funcionário do condomínio servir ao morador e se acidentar, a responsabilidade é do condomínio. E se ele fizer isso regularmente, pode acionar o condomínio e isso envolve risco trabalhista.
Os prédios e construtoras estão atentos à acessibilidade?
É lei municipal, estadual e federal e tem muitos condomínios que estão irregulares. Preferem investir em nova decoração, por exemplo. Acessibilidade é para todos, para quem tem mobilidade reduzida, temporária ou não. É uma questão de cidadania.
Algo mais?
Um assunto importantíssimo para os prédios novos: os moradores deveriam contratar um perito para certificar de que tudo foi construído sem falhas, dentro da garantia dada pela construtora. Em caso de erro, se estiver dentro do prazo de garantia, as construtoras precisam consertar. Caso contrário, perdem o direito de reclamar.
O que é viver em condomínio?
É uma arte. De respeitar o próximo, de viver em grupo, de coletividade, de tolerância e bom senso. E, acima e tudo, é o exercício de viver com pessoas de hábitos e culturas diferentes das nossas, mas que dividem um espaço comum.
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