Qual será o futuro do Brincante?

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Depois de 22 anos de Vila Madalena, o teatro recebe ordem de despejo.

Criado pelo casal de multiartistas Antonio Nóbrega e Rosane Almeida, o Brincante reúne, além do teatro, um grupo de dança e pesquisa, tem uma série de oficinas e cursos para músicos e dançarinos de quase todas as faixas etárias.

Rosane Almeida, artista e bailarina, é quem cuida da parte administrativa do Brincante: “Já formamos mais de 19 mil artistas e educadores, além de ter uma programação constante de espetáculos em nossa sala”. E a partir dessa ação de despejo, ela não sabe qual será o futuro do Brincante. “Sei que não podemos deixar este prédio nos 15 dias que foram pedidos pelo dono do imóvel”, lembra.

A notícia da notificação de despejo do Brincante foi veiculada pelo jornalista Gilberto Dimenstein no dia em que o Brasil foi derrotado pela Alemanha por sete a um, na Copa do Mundo. A partir de então, várias manifestações surgiram em defesa do Brincante. Foram criados o #ficabrincante e uma petição no Avaaz no intuito de convencer o dono e a empreiteira Pedra Forte de reverter a situação. “É um abaixo-assinado endereçado ao dono do imóvel e ao provável comprador para manter o Brincante em seu atual endereço”, explica Antonio Nóbrega, artista premiado e que tomou outro rumo em sua carreira de músico em Recife a convite de Ariano Suassuna, que o convidou a integrar o Quinteto Armorial.

No domingo, dia 3/8, o Brincante reuniu mais de dez mil pessoas num show para a permanência do Teatro Brincante na Vila Madalena. Além dos shows, batucadas e outras manifestações musicais, teve construção de brinquedos e brincadeiras, rodas de versos, contação de histórias, capoeira.

Rosane e Nóbrega chegaram à Vila quando buscavam um espaço onde montar o espetáculo O Brincante, que havia sido premiado no Festival de Teatro de Curitiba. “Nenhum dos teatros que procuramos aqui em São Paulo pôde nos receber. Em busca de um lugar, encontramos este galpão aqui na Rua Purpurina, que foi uma fábrica de lustres e estava abandonado”, conta Rosana.

Com a crescente especulação imobiliária que a Vila Madalena tem passado nos últimos anos, o casal do Brincante sabia que um dia isso iria acontecer e se preparavam para fazer uma oferta pelo imóvel. “Sempre desejamos comprar este imóvel. Mas o dono o pediu para ele e conforme o contrato que temos, ele pode pedir o imóvel para uso próprio e determinar um prazo para desocupação”.

A advogada do Brincante, Renata Maluf, entrou com ação judicial para questionar o direito (de compra do imóvel) que não foi garantido aos inquilinos. Rosane lembra que eles se reuniram com o advogado do proprietário e da construtora, que é a mesma pessoa, em busca de uma negociação, mas não houve avanço. E Rosane e Nóbrega acham que houve um desrespeito à lei do inquilinato, que deve oferecer ao inquilino as mesmas condições de compra.

Em entrevista ao portal G1, o proprietário do imóvel, César de Oliveira Alvez, disse: “Eu estou há mais de oito anos segurando porque não queria vender. Minha intenção nunca foi vender, mas cheguei a um ponto de problemas de saúde e de uma série de coisas pessoais, e as construtoras sempre em cima, que eu tive que vender”. Por sua vez, a Pedra Forte não confirmou a compra.

Para Rosane, será difícil o Brincante sair daqui antes de novembro de 2015. “Eles têm que negociar com 2.600 pessoas, que são nossos alunos, professores, funcionários, alunos de escolas públicas. Temos agendados até novembro de 2015 espetáculos, palestras, aulas, oficinas. Não podemos sair de uma hora para outra. Tem gente que até estranha essa nossa organização em médio/longo prazo. Mas é assim que conseguimos pagar as contas e obrigações”, explica.
Apesar dos últimos acontecimentos, a programação dos cursos, oficinas e os espetáculos programados no Brincante não sofreram nenhuma alteração. Até uma reestreia está agendada para o próximo dia 15/8, com a peça A Mais Bela História de Deodata, com Rosane se dividindo em três papéis femininos.

“Ficar na Vila Madalena é o nosso desejo”, diz Rosane. “Neste momento não conto com a possibilidade de sairmos daqui. Depois de 2015, eu tenho certeza de que para onde for será melhor”. E ela explica sua certeza: “Quando abrimos este espaço, as condições eram muito mais ásperas e mais difíceis. Na época, era eu e o Nóbrega com dois filhos pequenos, sozinhos, com algo na cabeça e no corpo que não sabíamos o nome, mas sabíamos o que queríamos fazer. Éramos desconhecidos e solitários, e tivemos de montar um lugar para nos apresentar”.

Sobre essas duas décadas de Vila Madalena, o Brincante, segundo ela, não foi fácil. “Foi mais difícil arrumar um lugar para mostrar nosso trabalho do que criar o espetáculo. Era o que sabíamos fazer. Nós éramos uns zé-ninguém. E desde que nos estabelecemos aqui, nunca foi fácil. Cada dia, cada ano era uma escolha que a gente fazia para estar aqui dentro. E sempre escolhemos dar prosseguimento ao trabalho do jeito que a gente achava ideal. Hoje, quando me sento nestas cadeiras – no início, eram apenas os degraus duros e mais nada –, acho que é uma afirmativa de que acertamos. Nosso percurso foi longo e tivemos muitas pessoas que foram tocadas pelo nosso trabalho”.

Quanto ao futuro, Rosane não está pessimista. “Não posso achar que uma mudança possa ser uma coisa ruim. Ela vai nos levar para outro lugar, será diferente e provavelmente o trabalho terá as mesmas características. Vejo que a partir de 2015 vamos atuar num outro lugar físico ou filosófico. Vamos continuar nosso caminho”.

Instituto Brincante
Rua Purpurina, 428, Vila Madalena
Telefone 3816-0575
www.institutobrincante.org.br

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