Ganhando de você mesmo

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Mulher paulista e predestinada, nascida em 1964, ano em que a coisa aqui no Brasil pegou para quem desejava mais liberdade de expressão e de atitudes – Gisela Rao, publicitária, jornalista e escritora, botou a boca no trombone para se fazer escutar sobre uma condição bastante comum entre as pessoas que vivem se desvalorizando diante do outro, ou admitindo a condição de viverem papéis secundários, enquanto superestimam quem não merece ou quem não está nem aí por você. Foi com a própria experiência que a escritora reverteu totalmente o cenário da sua vida. E para melhor, bem melhor, como ela mesma contou para a reportagem.
A metade da sua vida viveu no bairro paulistano chique de Higienópolis e, a outra metade, se embrenhou pelos bairros mais descolados da zona oeste: os bairros do Sumaré, Perdizes e Vila Madalena. Está no segundo casamento e diz que jamais recebeu o chamado da natureza para a condição de ser mãe. Outras revelações e experiências que poderiam ser sua também, você terá nessa divertida entrevista que o Guia da Vila Madalena fez para o emblemático e romântico mês de junho. E, aproveite para se amar.

O que você faz hoje é o que você planejou para a sua vida?
Não sei dizer se é um planejamento ou um sonho. Mas sempre escrevi e desde criança quis ser escritora. Meu primeiro trabalho publicado foi um poema, aos oito anos de idade, na Folhinha de São Paulo, chamado “O Coração”. Hoje tenho cinco livros publicados e um sendo formado na cabeça.

Você associa autoestima ao bom humor ou é adepta ao provérbio “se a vida te der um limão faça uma limonada”?
Primeiro, vamos entender o que é autoestima para a gente falar dela, porque muita gente confunde. Baixa autoestima, para mim, é uma vício nutrido diariamente com a autodepreciação. Portanto, autoestima é a arte de “apreciar-se, de se dar valor”. Para se dar valor, você precisa pegar um “tupperware” e colocar todas as suas qualidades. Todas mesmo. E todo mundo tem um punhado delas, embora nem todo mundo saiba disso. Então, no meu caso, o bom-humor certamente é uma das minhas qualidades e, portanto, tem tudo a ver com autoestima. Eu rio muito, acho tudo muito engraçado e, quando não acho, dou um jeito de ficar. Agora, ganhar limão e fazer limonada é também outra das minhas qualidades, menos quando estou com preguiça (risos).

Quais situações te provocam preguiça?
Sou extremamente eremita. Não gosto muito de sair de casa, ou melhor, do bairro. Então, é mais fácil fazer coisas no meu perímetro. Também não sou muito disciplinada e tenho déficit de atenção forte.

Como surgiu a ideia do Blog? Alguém te ajudou?
Há 10 anos, formamos um grupo intitulado “Vigilantes da Autoestima” e nos reuníamos em um prédio onde eu morava. Éramos em sete mulheres e nos encontrávamos toda semana para contar nossos perrengues, dar risada, apoiarmos umas às outras, comer comidinhas gostosas… O grupo durou 2 anos e ajudou cada uma a se fortalecer. Anos depois, resolvi fazer isso virtualmente para que eu também pudesse olhar todos os dias para mim (mulheres não fazem muito isso. Olham o tempo todo para os outros e muitas vezes esquecem de si mesmas) e também olhar para ao grupo. Minha ex-psicóloga, Neiva Bohnenberger, foi minha grande incentivadora. Quando a “jiripoca pia” me comunico com ela.

Onde você se inspira?
Mais fácil perguntar o que não me inspira. Como trabalhei tempo como criativa de publicidade, tenho muita facilidade em ligar uma coisa com outra. Desde uma folha que cai a alguma história que alguém me conta. Trabalho muito com metáforas e vejo metáforas em tudo. E no blog, tento pegar as coisas que acontecem ou que percebo e dar uma transcendida básica.

Como foi o processo de criação do blog Vigilantes da Autoestima?
Agora estamos com um layout novo, feito pelo UOL, mas antes foi feito por um amigo webdesigner. Escolhemos uma foto no Getty Images (de uma mulher soprando um balão em forma de coração) e ele colocou no ar. Claro que o primeiro post foi sobre os bullyngs que rolaram na minha infância. Afinal, é nessa época que a gente forma a autoestima. Em uma semana, ele caiu nas graças do UOL que o convidou para ser um dos destaques da blogosfera. Percebi que muita gente passou a seguir o blog e isso, certamente, foi uma das grandes motivações para eu continuar. Ele tem mais de 4 milhões de acessos.

Como isso mexeu com a sua vida? Quais as principais transformações?
A primeira transformação foi perceber que ele era uma espécie de missão de vida, como, aliás, o astrólogo Quiroga – dez anos antes – me havia dito que seria. Então, o blog Vigilantes da Autoestima me fez finalmente me sentir uma pessoa plena e posso dizer que aí encontrei a tal da felicidade. Aos poucos, fui fortalecendo minha autoestima pelo simples fato de praticar o que eu mesma dizia (risos) e por ajudar tanta gente. Tenho mais de 17 mil comentários e e-mails de pessoas que puderam explorar mais as suas potencialidades e ter uma vida mais legal, mais feliz.

Estou entendendo que sua autoestima aumentou com o crescimento do seu processo criativo. O aumento de leitores e de seguidores faz toda a diferença para esse estado. Mas, e aqueles que a “elevação” da autoestima não dura mais que alguns dias, ou até a próxima frustração, como exercitar e melhorar essas atitudes?
Com o STOP MINHOCATION, ou seja: as três regras do VAE: 1- Pare de se autodepreciar, 2- Pare de fazer listas de infelicidades e 3- Rasgue o papel de vítima. Te garanto que as quedas vêm de algum ou de todos estes. Lembrando também que se a autoestima é o seu tupperware de qualidades, seja lá o que aconteça na sua vida, as suas qualidades não mudam. A não ser que você seja abduzido.

Quais os pontos negativos, “a outra ponta do iceberg?”
Não chega a ser um ponto negativo, mas tenho uma responsabilidade muito grande, então não posso deixar de escrever. Cerca de 2.000 pessoas esperam pelos posts diários. Então, até na minha lua de mel eu escrevi para o blog. Uma outra coisa é que, quando você faz sucesso, mexe com o lado sombra das pessoas, então sofre muitos ataques de gente invejosa e cia. Mas agora o UOL modera os comentários, então, nem recebo mais nada. Mas já teve comentário bem barra pesada.

Você respondeu a todos ou fez a linha “não me misturo com essa gentalha”?
Pessoas que diziam que eu queria explorar as leitoras ou que atacavam a mim e aos Vigilantes mais constantemente com ofensas pessoais. No começo eu ia para o “pau”, depois comecei a ser irônica, depois, quando comecei a moderar antes de ir ao ar, passei a ignorar. E caiu muito o número quando passei a moderar porque essa gente infernal quer plateia para esparramar seu enxofre.

Escrever sem inspiração faz a jiripoca piar?
Quando não tenho inspiração cito o caso de alguma leitora, dou um jeito. Para a jiripoca piar, hoje em dia, a treta tem que ser muito grande.

Você disse que sempre quis ser escritora. Durante a sua carreira de publicitária, você conseguia fazer isso, quero dizer, você era totalmente feliz ou flutuava?
Escritora é uma coisa, carreira é outra. Tem muita obrigação. O meu único grande sucesso em publicidade foi quando consegui juntar os dois e criei a personagem Virgínia Novick para as Lojas Marisa, em 1989. Aí fluiu que foi uma beleza.

Em sua opinião, até quanto o amor pode ser decisivo para a felicidade do ser humano e por quê as mulheres se doam mais e necessitam mais de amar? Você recebe e-mails masculinos falando de amor mal resolvido?
Recebo, mas são poucos, meu público é 10% masculino. Tem um texto que corre pela internet que concordo plenamente nos dias de hoje e que diz que o amor tem que complementar e não completar. Quando eu conheci meu atual marido, estava há 1 ano sozinha e feliz da vida. Ele só aumentou a minha felicidade. Eu já estava inteira, entende. Portanto, estamos juntos porque nos gostamos e não porque precisamos um do outro. Mas, para a grande parte das mulheres, isso não acontece (eu já fui assim). Elas acreditam que o homem é o ISO 9000 e, portanto, sem eles, elas não têm valor. E se desesperam. Desesperam-se também porque, em país latino e católico, todo mundo cobra muito a posição de ser casada e ter filhos.

Dê uma dica de como ser feliz no relacionamento, ou, como conquistar um amor em 5 lições.
É um pouco do que falei, mas para reforçar, listamos algumas:
1. Valorize-se o mais que você puder. O maior afrodisíaco é uma pessoa de bem com a vida e consigo.
2. Entenda porque é difícil ficar sozinha(o) e comece a trabalhar isso antes de qualquer coisa.
3. Da mesma forma que comida estragada faz mal à saúde, amor tóxico também faz. Pare de se iludir e criar fantasias em cima das pessoas e tente vê-las como realmente elas são. Acredite, isso também fará muito bem a elas.
4. Seu amor não é o centro do seu Universo. Você é quem o é. Amor é um planeta, assim como trabalho, amizade, hobbies, cultura etc.
5. Tenha vida pessoal. Quando você gruda demais em uma pessoa, ela se afoga. Encontre a sua liberdade para respeitar e curtir a do outro. Quando você cuida da sua vida com qualidade, tudo flui e você não dá espaço para pragas como ciúmes, encanação.

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