A chef Viviane Gonçalves entrou sem querer na gastronomia. Hoje, ela tem um currículo invejável. A profissional até já trabalhou em seu restaurante próprio, o Alameda, que ficava do outro lado do mundo: em Pequim, na China. Inclusive, a profissional foi premiada por lá.
A revista That’s Beijing a gratificou com os títulos de Melhor Restaurante, Melhor Chef, Melhor Serviço, entre outros. Isso aconteceu por três anos consecutivos. Mas antes de tudo isso, Vivi morou seis anos na Inglaterra, entre Londres e Bristol. Na região, estudou “Catering & Hospitality”, no City of Bristol College, e trabalhou como sous-chef na badalada casa “Bocanova”. Voltando ao Brasil, em 2010, estagiou nos prestigiados restaurantes “Maní” e “D.O.M”. Agora, a chef assume uma nova empreitada e desembarcou na Vila com o seu novo restaurante o “Chef Vivi”. Mas isso não é só, mesmo com pouco tempo de casa, o sucesso dele já é visto e colhe frutos, tanto que Vivi acaba de ser agraciada com um prêmio da revista Veja, como Chef Revelação.
Onde você nasceu?
Sou nascida em São José dos Campos, no Vale do Paraíba.
Como foi sua trajetória na gastronomia?
Fiz faculdade de História e Geografia, mas desde os 16 anos fazia doces para ter meu próprio dinheiro e comecei a trabalhar na pizzaria Perequim, em São José dos Campos, isto aos 19 anos. Acredito que foi meu primeiro passo, comecei ajudando na fila de espera, depois no caixa e na administração. Em 1992, abri com uma sócia e minha irmã, o Cabala Bar e Café, foram cinco anos, aprendi muito e comecei a participar da cozinha e foi quando decidi ser cozinheira. Em 1997, conseguimos comprar uma chácara a 13 km do centro de SJC, e abrimos o restaurante Coelho e Cabrito, foi incrível e muito difícil ao mesmo tempo. Ainda não tinha uma formação, era tudo muito empírico, muitos acertos e erros. Conseguimos manter o restaurante por três anos, quando decidi aceitar o convite para abrir o restaurante em Pequim, na China, no final de 1999.
Quem fez o convite?
O convite para abrir o restaurante na China foi feito em 1992, por um cliente que se tornou um grande amigo. SJC é a capital da tecnologia brasileira, onde está a Embraer, o INPE e etc. O governo brasileiro tem uma parceria com o governo chinês para desenvolver os nossos satélites. Neste ano, meu amigo foi convidado para abrir alas para os outros engenheiros brasileiros em Pequim. Em sua 1a viagem, ele ficou muito impressionado com a velocidade que tudo acontecia no país e a carência de um restaurante ocidental. Foi quando recebi a proposta, tinha 24 anos e não tinha ideia do que poderia ser aquela terra. Para mim, a China era fechada e comunista, e não me atraia nem um pouco. Cheguei lá em 2004, no momento correto e na hora certa, o mundo estava voltado para o lugar. Pequim em plena construção. O mundo estava lá, 4 anos antes das Olimpíadas.
Você teve muitas dificuldades nesse restaurante do outro lado mundo?
Quando falamos em pessoas, seja China, Brasil ou Inglaterra, somos iguais. Administrar um restaurante e uma cozinha, não é uma tarefa fácil em nenhum lugar. Trabalhamos com pessoas, humores, ambições e etc. O dia a dia é extremamente cansativo e no ponto de vista administrativo mais ainda. E raro conseguir afinar uma equipe que pense no todo, na união e quando conseguimos isto é único. Acredito que consegui isso na China, talvez pela valorização dos chineses que trabalharam comigo, eles foram treinados, respeitados e valorizados. Em um país de 1.300.000 de habitantes, quando eles conseguem isto, existe uma valorização muito maior do que está acontecendo hoje aqui no Brasil.
Quais as diferenças de trabalhar na China e no Brasil?
Trabalhar na China é tão difícil como no Brasil. É bastante burocrático, leis que mudam. Mas mesmo assim o nosso Brasil ganha, colocando tantas leis e dificuldades para o pequeno empresário.
Como foi escolhido o cardápio para esse restaurante chinês?
Em relação aos ingredientes, minha cozinha em Pequim era contemporânea, com toques brasileiros, a carne vinha da Mongólia, Austrália (carne e vieiras) e Nova Zelândia comprava o carré de cordeiro (que até hoje eu amo fazer). Em relação a verduras, era bem difícil encontrar as orgânicas, mas os mercados eram muito interessantes e atraentes, amava ir às compras e negociar diretamente. Todo sábado fazia nossa feijoada, mas tinha que produzir nosso paio, nossa calabresa, e preparar a carne seca. No couvert, que era de graça, tinha o também nosso pão de queijo que eu assava na hora, os pães eram todos feitos na nossa cozinha.
Soube que estudou em vários outros países. Quais foram esses lugares?
Quando decidi ir à China, decidi passar primeiro pela Inglaterra. Fiquei 4 anos por lá, fiz um curso de gastronomia de duração de 3 anos e trabalhei em um restaurante do país. Fui treinada, e foi uma época muito fascinante, tudo era novo e tudo era aprendizado. Cheguei a trabalhar 96 horas era tudo tão intenso e novidade. Assim aprendi muito sobre cozinha, equipe e como tudo é muito sério, temos horas a fio. O dia começa muito cedo e termina muito tarde.
Qual a principal característica da gastronomia feita por você?
A principal característica é conseguir boas parceiras com os fornecedores, é preciso correr muito para conseguir e fazer entender o que você quer, mas nunca podemos deixar de procurar novas fontes. Tenho que mostrar qual é a filosofia da minha cozinha, a mudança do menu diário, melhorar constantemente e sempre acreditar no melhor. Acho minha cozinha rústica, mas tem uma certa delicadeza e a eterna preocupação com a correta execução e a valorização da matéria-prima. Quero aprender com os fornecedores, e acho que isto acontece diariamente. Como não existe um pedido fixo, tenho que conversar todos os dias com eles. A minha comida, eu tento trabalhar com o máximo de orgânicos. Gosto muito da harmonia de um prato, do equilíbrio dele. Acho que quando você come, a refeição tem que te fazer bem. Temos que alimentar a alma. Aqui, sempre vai ter um peixe, uma carne vermelha, e o respeito ao vegetariano. Minha comida é muito leve. Gosto das cores e da crocracia dos vegetais.
É verdade que raramente repete um prato? Como consegue essa façanha?
Mudar o menu todos os dias, para mim é uma maneira mais interessante de trabalhar. Na verdade existe uma estrutura de cardápio, um conceito. Quero ser mais sustentável, não tenho câmara fria e nem freezer. O que produzimos hoje, usamos no mesmo dia. Tenho pouco estoque, aprendi muito quando estava na Inglaterra e foi assim que também trabalhei na China, lá eu já mudava os ingredientes todos os dias. Eu aprendi a respeitar o planeta que estamos vivendo. Tento treinar a minha equipe e passar isso para eles. Desde desperdício de uma cozinha, desde o excesso de lixo. A maneira que trabalho é mais justa. Tem menos desperdício. O brasileiro tem uma mania de desperdiçar mais que o europeu e o asiático. A china passou por uma revolução cultural não tinha o que comer. Há escassez da água na Europa. Tudo isso agregou meu conhecimento.
O que gosta de cozinhar?
Meu tempo está um pouco curto, estou bastante envolvida, não só com a cozinha, mas com o todo o Chef Vivi. Segunda é o meu dia de folga, só preparo O meu café da manhã. Amo comer pizza!
Quais foram as experiências mais recompensadoras na gastronomia?
A maior recompensa é conseguir formar e treinar a equipe, deixar a equipe inspirada, deixá-los crescer e consequentemente aprender com eles, e sempre continuar.
De onde surgiu a ideia de montar o restaurante no Brasil?
Amo a Vila Madalena. Minha sócia Poliana quem me convidou para montar um restaurante aqui, adoro as ruas, sobe e desce, o clima das pessoas e é onde eu escolhi para morar também. Pena que está bastante suja, sem cuidado, muito lixo infelizmente não é só aqui, é um problema cultural.
Como recebeu a notícia que você foi considerada a Chef Revelação pela Veja SP?
Foi muito, mas muito bom receber este prêmio. Não só para mim, como para minha equipe. Afinal, não trabalho sozinha, preciso de força e uma bela equipe.
Se fosse indicar hoje seu chef favorito, quem seria?
Existem muitos, mas muitos bons chefes. Admiro cozinheiros que amam e fazem disto seu ofício. Nomes? são vários e nem sempre é preciso ser estrelados. E sim amar a profissão, com respeito e dedicação.