Arapuca de mágico

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Para Juarez Silveira

Bom de bola, de briga e de matemática. Betão, meu irmão. Ganhou naquele ano, onde golpe foi chamado de revolução, a “Gincana de Matemática” do Grupo Escolar São Paulo. Como prêmio, lá de casa ganhou seu primeiro relógio e duas entradas para o circo. Roupa de domingo. Beto dava topada atrás de topada pelas calçadas de tanto olhar para aquele relojão bonito, que me fez sentir uma inveja fininha, miúda e muda, assim como o seu ponteiro dos segundos.

Sentados, luzes apagadas, de repente, um tambor acelera sua pulsação e um holofote imenso clareia o picadeiro. A cortina vermelha se abre junto com nossas retinas. Malabaristas, trapezistas, palhaços, mulher gorila e bichos amestrados.

Após o motociclista do globo da morte, surge a atração principal do circo: “Mandrake, o grande Mágico”, acompanhado por duas loiras de maiô com lantejoulas que tanto nos fez sonhar por longas noites seguidas, dedicadas lembranças cintilantes protegidas sob os lençóis do trêmulo beliche.

O grande Mandrake, com sua varinha de condão, fazia sumir tudo da sua frente. Calça de palhaço, jaula de macaco, o macaco e o escambau. Interrompe tudo. Pergunta para a plateia, agora sob os holofotes: “Quem tem algo aí? Vou fazer desaparecer”. Era tudo que eu queria. Meu dedo indicador apontou rapidinho para a cabeça do meu irmão e gritei: “Ele aqui ó, tem um relógio!” Imediatamente veio uma das assessoras do Mandrake e leva o relógio do Betão. As luzes voltam para o palco. Tomo um baita coque na nuca seguido de um solapo direto no estômago. “Calma, meu, tá louco? Ele vai devolver.”

Passa o tempo e nada de relógio aparecer. Intervalo. Água, pipoca, algodão-doce, quando uma das trapezistas com um tabuleiro de empadas para na nossa frente. E oferece ao mano:  “Pega, é cortesia.” Betão morde com tudo. “CRECRET!” “Que foi, é o relógio?”. Daí o Betão, na sua vez de me sacanear, disfarça, mete o relógio no bolso e diz: “Não. Foi o caroço da azeitona! Você já viu relógio dentro de empada, sua anta?!”

Por Pedro Costa

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