Vila política, vila artística

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Eu freqüento a Vila Madalena desde a década de 60. Naquela época, era um bairro com casinhas bem pequenas e simpáticas, moravam pessoas da classe média e baixa, era uma comunidade mesmo, as pessoas se falavam.
Depois, começaram a aparecer os bares e restaurantes, que mudaram bastante a cara do bairro. Acho que eu também fui um pouco responsável por isso porque, de tanto gostar da Vila, montei em 1984 o restaurante Danton, onde hoje funciona o Mojave Jazz Bar. Foi praticamente o primeiro restaurante que veio para o bairro. Foi sucesso por 20 anos e ficou conhecido porque era um restaurante sofisticado de culinária francesa. E todos os políticos que estavam lutando pela democracia frequentavam, inclusive Franco Montoro, Bresser Pereira, Mário Covas e Fernando Henrique. Além disso, montei o Bar Avenida, a chopperia Continental e outros bares conhecidos das pessoas.
Depois, muita gente veio para a Vila e hoje é essa maravilha de bares e restaurantes, que muitas vezes a gente tem até que lutar para conseguir acomodar as casas noturnas com os moradores para todo mundo poder conviver sem conflitos.
Aquela vila simpática e comunitária foi dando lugar a uma outra dinâmica, mais comercial. Depois dos bares e restaurantes, com a fama adquirida, veio também o artesanato e até algumas lojas de luxo. Então, a Vila se divide, principalmente, entre comércio sofisticado, comércio de artesanato, além de grandes prédios com apartamentos sofisticados e algumas vilazinhas e ruazinhas residenciais.
Essa agitação de pessoas e mesas na calçada, a descontração da população, a qualidade da vida noturna, da gastronomia, a juventude que circula, os namoros que se fazem, o espírito de liberdade que a gente sente em suas ruas são justamente o símbolo da Vila Madalena.

Contra a ditadura

Lembro que freqüentei muito a Vila na década de 60, quando os estudantes ficavam no bairro, afinal, era bem próximo da USP. Nós vivíamos e lutávamos contra a ditadura. Aqui tinha muitas repúblicas, muitas reuniões.
Por essa razão, ficou muito difícil viver por aqui. Nos anos 69 e 70, a Vila era vigiada constantemente por peruas C-14 da operação bandeirante, do DOICOD, e volta e meia a gente via estudantes sendo presos.
Aos poucos, muitos moradores tiveram que desertar o bairro porque ficou um horror naqueles anos todos. Tinha muita polícia política e esse cenário durou quase 10 anos.
Na Praça Benedito Calixto, por exemplo, tinha um prédio que foi invadido e foi praticamente todo mundo para a cadeia. Aqui perto tinha o CRUSP, centro de residência universitária, onde eu também me refugiei, e também foi invadido pelo exército.
Acabei sendo preso por um tempo. Quando saí, voltei para a Vila Madalena. Foi nessa época que começou a feira da Vila. Tivemos um ótimo pretexto para continuar na luta contra a ditadura. Como tudo era proibido, nós aproveitávamos a oportunidade de ter todas aquelas pessoas juntas para distribuir folhetos pela volta da democracia.
Dessa forma, a feira ficou sendo um centro de resistência muito importante, foi adquirindo fama e, com o passar do tempo e a volta da democracia, foi se transformando num centro, numa instituição mais artística, mais filantrópica, mais cultural e menos política.

Homenagem

Em julho de 2003, o Guia da Vila publicou uma reportagem sobre os 50 anos de casados de Ivone e Antônio Bernardo. “Seu” Antônio faleceu no dia 22 de setembro. “Ele lutou contra a morte e completaria 79 anos. Desde que nasceu, e depois de casado, ele morava na mesma casa na rua Arapiraca, na Vila”, relembra dona Ivone em homenagem ao marido.

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