Máximo La Matta faz da Vila Madalena constante inspiração para suas criações, que funcionam como registros históricos do cotidiano do bairro nos dias de hoje.
Vim para o Brasil em 1978 trazido pelas dificuldades políticas e pela repressão que era grande em Buenos Aires, cidade onde me criei e estudei arquitetura. Naquele tempo, tínhamos a sensação de que o mundo realmente se transformaria pelas revoluções comandadas por Che Guevara e pela poesia filosófica das canções de John Lennon. A contra-revolução, porém, começou a ficar cada vez mais bruta e decidimos, eu e minha mulher, nos mudar para o Brasil. Passei um tempo em Arraial D’Ajuda, na Bahia, mas bastou que a movimentação se tornasse muito grande por lá para que eu escolhesse mudar de rumo novamente, vindo para São Paulo. Embora arquiteto formado – e já tendo experiência neste ramo – decidi que me dedicaria completamente às artes, principalmente às artes plásticas e à música. Viver em um bairro colorido, cheio de vibração e com uma energia muito propícia para a criação é a principal inspiração para estar morando na Vila Madalena há mais de 15 anos.
Hoje minha casa além de ser meu ateliê acabou virando um ponto de encontro de pessoas interessadas em aprender arte, trocar experiências, comungar idéias. Para mim é fundamental este arejar, esta movimentação constante. Ela me alimenta para a produção dos quadros que faço retratando em cores vibrantes os lugares da própria Vila, com a idéia de criar uma documentação histórica do bairro por meio da pintura, como era feito em diversos lugares do mundo na época em que a fotografia ainda não existia. Há quadros meus na Livraria da Vila, no bar Café Pequeno, no bar Astor e em outros locais do bairro. Este acaba sendo o resultado do meu exercício constante de artista, da troca que estabeleço com o lugar e as pessoas daqui e das minhas vivências mais subjetivas.
A Vila lúdica
Outra coisa que acho muito interessante aqui é o constante clima de celebração, com a grande circulação de pessoas no espírito de aproveitar a vida de forma agradável, buscando a alegria como forma de espantar os sofrimentos, além de filosofia e arte para crescer neste sentido. Há obras minhas em bares que acabam se transformando em locais que considero quase sagrados por permitirem uma comunhão real entre as pessoas, que optam por estar juntas para trocar boas energias ao redor de uma cerveja gelada. Acho que esta é a delícia da Vila Madalena, a alegria e a arte estão presentes na maioria das coisas, mesmo as supostamente mais cotidianas.
Quando eu tinha 15 anos sabia desenhar como Rafael, mas precisei uma vida inteira para aprender a desenhar como as crianças, disse certa vez o pintor Pablo Picasso. Eu acho esta frase muito sábia e acredito que, por mais que o tempo passe, estamos sempre aptos a desenvolver a beleza e o espírito da criança que carregamos conosco. Eu vejo a expressão deste espírito por onde ando na Vila Madalena. Feliz por envelhecer aqui, onde sinto o que tenho de mais lúdico em mim alimentar-se e desenvolver-se para depois transformar-se em quadros e músicas.”