Uma Vila de letras e cores

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Cláudio José cria cartazes lambe-lambe que já fizeram parte do visual e ajudaram a agitar a Vila Madalena.

Trabalho fazendo cartazes lambe-lambe há aproximadamente 25 anos e foi com este ofício que criei os meus três filhos. Durante muito tempo era possível ver o resultado do que crio em minha gráfica por todos os lados da Vila Madalena, com os lambes-lambes anunciando shows e atrações de casas tradicionais da região. Meus primeiros clientes foram circos que chegavam à cidade e precisavam divulgar os seus espetáculos. Desde então, fui me desenvolvendo, contratando pessoas e me especializei definitivamente. Já fiz até trabalhos para outros países como a Alemanha, a Itália e a França.
O local onde hoje moro e trabalho faz parte da chácara que pertencia ao meu avô, um lugar que já foi muito tranqüilo e que além de ter várias árvores frutíferas, contava com mais de 40 caixas de abelhas que produziam mel. Eu nasci aqui na Vila em 1949, me mudei muito pequeno para a Vila Sônia e retornei aos 16 anos de idade com meus pais para uma casa na Fradique Coutinho. Nesta época as ruas de terra já haviam sido asfaltadas e os bondes circulavam facilitando o acesso ao bairro. Na região onde eu vivia, a maioria dos moradores eram estudantes da USP e funcionários do Hospital das Clínicas, além das numerosas famílias portuguesas.
De lá para cá eu, que sempre gostei muito de viajar, conheci diversos lugares no Brasil, principalmente cidades na região Norte. Casei-me no Pará e novamente decidi viver na Vila Madalena, dando continuidade aos passos da minha família. Gosto muito do bairro, embora não seja freqüentador das baladas que estão ao redor aqui da Rua Fidalga. Confesso que às vezes me incomodo com o barulho e com a agitação. Nesses momentos, pego a minha bicicleta e vou pedalando, procurando por ruas tranqüilas. Costumo fazer esta atividade mesmo durante a noite e acho uma delícia. Outra coisa de que gosto é de ir até uma padaria 24 horas que há perto de casa para tomar um café. Essas são as minhas “baladas”, o meu jeito de aproveitar o bairro pelo qual tenho especial carinho.
Apesar de a Prefeitura ter proibido os lambes-lambes na cidade, minha pequena gráfica continua produzindo para as cidades da Grande São Paulo e também para filmes e comerciais. Existem alguns tipos de tipografia que são utilizados exclusivamente por mim e faço questão de colocar em cada peça os conhecimentos de artes gráficas que eu já adquiri. Sinto saudades da época em que caminhava pela Vila colando cartazes e podia ver muitos deles espalhados, mobilizando as pessoas e ao mesmo tempo informando sobre atividades artísticas.
Passo a maior parte do meu tempo trabalhando, ao lado de antigos companheiros que me ajudaram e muito na construção da minha carreira. Nos fundos da gráfica fica a minha casa e, no quintal, gosto de guardar objetos, restos de madeira e até pedaços de móveis que encontro por aí. As pessoas não entendem muito, mas gosto de guardar esse tipo de coisa, aguça a minha criatividade me fazendo pensar em objetos novos que posso criar a partir do que está inutilizado. Assim, no meio da agitada Vila Madalena, criei o meu espaço particular. Pode não ser tão agradável quanto na época em que existia nele uma chácara. Mas é a minha forma de estar em contato com as minhas raízes e com o bairro que me viu nascer sem deixar de lado o meu jeito de ser.

Colaboração: Deca Pinto

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