Uma Vila como herança

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Celso Cruz Lombardi nasceu e se criou no bairro e acha que as transformações da Vila trarão novas e belas histórias.

Eu nasci na rua Natingui e pouco tempo depois fui morar na rua dos Macunis, onde passei minha infância e adolescência com meus pais e avós. Hoje, continuo nas proximidades, em uma casa perto da praça do Pôr-do-Sol. Nasci em março de 1944 e posso dizer que cresci em um clima maravilhoso, de muita simplicidade, natureza, poesia, pé no chão, tudo muito gostoso. A casa onde morava tinha dezenas de árvores frutíferas no quintal e se parecia mais com um sítio. Todas as outras casas da rua também eram assim.
Era um local muito aconchegante e amável, onde todos os vizinhos tinham numerosas famílias que se conheciam, as crianças brincando juntas, inventando diversões. Uma das preferidas era o que nós chamávamos de “chocar o carroção”. Os lixeiros do bairro usavam carroções de lixo puxados a cavalo e, quando eles passavam, toda a meninada se pendurava na rabeira da lenta carroça. Os coletores de lixo sabiam os nossos nomes e nós os deles. Passávamos bastante tempo no futebol e vez ou outra íamos nos refrescar nas lagoas, bolsões de areia que eram escavados por empresas e que represavam água em épocas de chuva. Uma das maiores “lagoas” da nossa juventude ficava onde é hoje a praça Panamericana.
No futebol, a rivalidade entre os clubes daqui era bastante grande. Existiam quatro campos de futebol, um de cada time, e os jogos mobilizavam os moradores do bairro inteiro. Aos 17 anos, depois de me destacar em um campeonato, fui chamado para jogar no Ferroviária de Araraquara, como profissional. Fiquei lá pouco tempo, a saudade de casa foi maior do que o sonho de virar jogador. Ao voltar, passei a me dedicar aos estudos, encaminhando minha vida de outra maneira e me formando em Economia. Há 38 anos, porém, depois de trabalhar na área contábil, pendurei o diploma. E, em um terreno cedido pelo meu pai, abri um pequeno comércio, uma borracharia que também fazia troca de óleo, também na Vila. No mesmo ano, me casei. Aos poucos, o negócio foi crescendo, me permitindo expandir meu campo de atuação e criar meus filhos, hoje um publicitário de 27 anos e uma nutricionista de 29.
Para mim é importante perceber que passei adiante os valores herdados dos meus pais, o que me dá a sensação de missão cumprida. Também fico feliz em ver o bairro se modernizando, crescendo, virando ponto de encontro da rapaziada. Desde a época em que meu avô caminhava por aqui com seu carrinho de pipoca, passando pelos tempos em que meu pai era taxista dirigindo lotações – usadas por quem tinha um pouco mais de dinheiro e queria fugir do desconforto dos bondes que atravessavam o bairro –, eu percebo com orgulho a quantidade de histórias que já foram vividas, trazendo muitas transformações. Eu desejo estar por aqui em paz até os meus últimos dias, acompanhando o que os tempos modernos trazem para este lugar onde nasci e me criei, coisas novas e interessantes que um dia também virarão história.

Colaboração Deca Pinto
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