Um artista eclético

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Péricles Cavalcanti nasceu no Rio de Janeiro em 1947 e mudou-se para São Paulo em 1950. Desde muito cedo, conviveu com música: o pai era violonista e tocava um pouco de flauta e a mãe cantava. Aos 12 anos, já “arranhava” o violão.
No começo dos anos 1960, na adolescência, Péricles acompanhou com enorme interesse o movimento da Bossa Nova, seus compositores e seus intérpretes, assim como a Jovem Guarda, o surgimento do Rock ‘n Roll e quase tudo que tocasse em rádio, nos bailes estudantis ou em discos, fosse canção tradicional, jazz ou pop. Acompanhou de perto o desenvolvimento do Tropicalismo, através da amizade com seus amigos baianos principalmente Caetano e Dedé Veloso.
As primeiras músicas do repertório do grupo Novos Baianos influenciaram-no bastante, embora se tornar músico profissional não estivesse no plano de Péricles que estudava filosofia e pensava em ser professor. Talvez o contato com esta variedade musical seja a razão para que ele, hoje, prefira não classificar o estilo de suas canções.
Foi em 1970 que Péricles realizou sua primeira gravação profissional como músico, participando como violonista e vocalista de apoio na trilha que Gilberto Gil concebeu para o filme de Rogério Sganzerla, “Copacabana mon amour”. Mas foi no final de 1973 que um acontecimento teve enorme importância em sua vida. Ele conheceu a baiana Ana Amélia Carvalho por quem se apaixonou a ponto de sentir esse encontro como um tipo de nascimento e de começar a compor canções para comemorá-lo. Daí em diante não parou mais.
Prestes a lançar seu quinto CD, Péricles Cavalcanti recebeu o Guia da Vila para uma conversa descontraída sobre a experiência como músico e a relação com o bairro. Confira!

Você ficou marcado como compositor…
Eu passei a trabalhar com vinte e tantos anos. Em 1973 comecei a compor. Só fui gravar meu primeiro disco, “Canções”, em 1991. Cássia Eller já gravou músicas minhas, assim como Arnaldo Antunes que também foi parceiro em algumas composições e participou do meu segundo disco, “Sobre as Ondas”.

Adriana Calcanhoto é sua principal intérprete? A música “Medo de amar nº 3” (veja letra no Box), gravada por ela, é a mais executada e tem uma curiosidade no nome…
O nome é uma homenagem à canção de Vinícius de Moraes “Medo de amar” e tem o numeral “3” agregado porque já havia uma outra homenagem chamada “Medo de amar nº 2”, de autoria de Suely Costa e Tite de Lemos. Essa é a minha música, de longe, mais conhecida recentemente. Não chegou a estourar, mas está sempre tocando comigo ou com a Adriana. Ela tem com freqüência cantado e gravado canções minhas, algumas feitas sob sua encomenda, mas trabalho com música há mais de 30 anos. Nos anos 1970 a Gal gravou algumas músicas minhas, o Caetano também, a Miúcha… Depois nos anos 1980, Asdrúbal Trouxe o Trombone, grupo da Regina Casé, gravou a música “A farra da Terra” aqui em São Paulo. Eu ainda não morava neste apartamento, morava na Heitor Penteado… Eu moro aqui há dez anos!

Você é carioca. Como chegou à Vila Madalena?
Carioca de nascimento. Vim para São Paulo com três anos. Fui criado na Cidade Vargas, onde hoje é a garagem do metrô. Sou paulista, mas nasci no Rio. Lembro que vinha encontrar amigos no Sujinho, da rua Wisard, para jogar futebol no colégio Santa Cruz ou então na Várzea, onde hoje é o Parque Villa Lobos. Isso lá por volta de 1979, 1980. Esses foram os meus primeiros contatos com a Vila Madalena. Quando o Arnaldo Antunes veio morar aqui, em 1991, fiquei conhecendo mais a região. A mulher dele foi quem me falou dos prédios do conjunto habitacional da Natingüi. Quando vi, adorei.

E como é sua relação com o bairro?
A Vila só vem melhorando. Tem uma coisa que eu adoro e sempre digo: a Vila é o lugar mais carioca de São Paulo! Aqui tem um lado que é um pouco Botafogo com os bares, tem até o cemitério que é meio parecido, e tem o lado que é mais Leblon, Jardim Botânico com edifícios sofisticados. É popular, mas ao mesmo tempo o metro quadrado, atualmente, é caríssimo e tem a vida noturna que é o máximo! Não que eu seja boêmio, mas gosto da noite. Não gosto de dormir cedo. A melhor coisa é poder morar em um lugar que não é vazio. Poder dar uma volta à pé pelas ruas à noite, tomar um chope. Não faço quase nada com carro. Até cinema vou aqui perto na sala UOL. Parece zona sul do Rio, onde todo mundo se conhece. Tem uma vida comunitária legal. Ao mesmo tempo é muito perto da cidade, muito cosmopolita. É um lugar bacanérrimo.

Também trabalha por aqui…
Já fiz algumas temporadas de shows em casas como o Blen Blen, mas não toco na noite.Trabalho em casa. O legal é que na região tem muitos estúdios. Tanto de áudio como de vídeo. Aqui já teve muitas produtoras de cinema. Atualmente não têm tantas. Houve uma época nos anos 1980 que a sede das produtoras era a Vila Madalena.

A Vila Madalena já serviu como inspiração para suas músicas?
Ah, já! Meu CD de 2004, o mais recente, tem uma canção que se chama Rock Stars (veja letra no Box). É um blues que fiz por causa das noites da Vila Madalena. Muitas vezes ando por aqui e vou tendo idéias.

Quando sai o próximo CD?
Estou preparando para ser lançado entre julho e agosto deste ano. O repertório tem três regravações de músicas minhas que eu ainda não tinha gravado. A maioria é inédita. São dez ou 11 inéditas.

E o estilo…
Eu gosto de coisa esquisita. Não gosto do título MPB. Tanto é que meu último CD se chama “Blues 55”. Cada canção diz o que quer a sua maneira. Sem precisar classificar. O que quer dizer MPB? Não quer dizer nada ou quer dizer tudo. Tudo o que se faz no Brasil: forro, rock, axé, funk carioca… Eu gosto de fazer música contemporânea. Brasileira ou não. É claro que faço letras em português, mas têm coisas em inglês também. Tem o lado cosmopolita, quando se grava uma música Pop, o “Pop” já desnacionaliza. Eu gosto de coisas que escapem de rótulos. Pode ter influência de blues, samba, que eu adoro. Isso sim é um gênero, genérico, que abarca várias coisas, tem características… O que eu tenho feito é uma combinação, acho que é uma tendência mundial, de arranjos e elementos eletrônicos com músicas chamadas erroneamente de acústica; a música desplugada.

Como é essa transição de compositor para intérprete? A satisfação é maior?
É maior. Eu adoro. Com o CD eu não só componho. Eu canto, toco, arranjo, produzo. Tanto o cantor só cantar como o compositor só compor é coisa de outra época. A época agora é de expressão total. Acho mais interessante.

Fonte:www.periclescavalcanti.com.br

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