Quem viver, viverá

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Estava filmando com Hermano o seu filme “Mário”, quando numa floresta muito densa, talvez jamais visitada por um não índio, em Rondônia, entre as dificuldades quase intransponíveis de filmar numa mata daquelas, ouvimos o canto do Uirapuru. Foi irresistível lembrarmos da lenda. Seriamos felizes para sempre e com vida muito longa, embora estivéssemos atolados em lama e estropiados pelo calor amazônico. Nos olhamos sem comentário algum, mesmo porque naquela circunstância esses horizontes lendários provocariam uma imensa gargalhada.
Passaram-se todos esses anos, mais de dez certamente, e a vida transcorre no mesmo diapasão, saltando vários obstáculos por dia. De algum canto do meu pensamento ouvi um antigo verso de Cecília Meireles: “Não sou alegre nem triste, sou poeta”. Mas, e eu? O que quer me dizer o extraordinário verso? Talvez que a felicidade prometida pelo canto da ave mitológica nem exista, ou que seja uma caretice tão grande que não se deva desejar. O fato é que, recentemente, ao encontrar com o Dalai Lama, voltei a refletir sobre o tema.
Estive por longos 30 minutos com Sua Santidade, como se refere a ele o Aloísio Monteiro, e falamos sobre a paz e a ecologia. Sobre a intolerância religiosa e racial. Demonstrou muita alegria pela luta dos Verdes brasileiros e revelou que quando ainda estava no Tibet não dava muita importância à ecologia, mas que agora considera a questão central de toda humanidade. Condenou a eficácia de qualquer ação carrancuda ou dolorida. Daí pensei que então a felicidade é uma arma quente, como professava Lenon. Uma ação política. De dentro pra fora e do universo para si.
Fui interrompido por um “que papo é esse meu compadre. Vou contar para o Pedro Costa que você pirou de vez”, disse Mineiro me ameaçando entregar ao nosso memorialista. Retomei o fôlego e pedi para não fazer uma coisa dessas, pois sem motivo ele já tinha me exposto semi nu, na revista anterior, com isso agora faria comigo algo impensável, me causando uma profunda infelicidade. Quer dizer, uma ação política ineficaz.

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