Domingos de dezembro

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A garotada tomava vinho com água e açúcar naqueles domingos. Mesas emendadas. Meus tios vinham do Cambuci passar o dia. Minha irmã selecionava na vitrola os LPs que rodavam tarantelas sem parar. Minhas primas pegavam as galinhas no galinheiro do quintal, as outras arrancavam as penas depois de fervidas em grandes panelas.

O primo solteirão metido a cantor, durante aqueles almoços, soltava sua voz de “Johnny Mathis italiano” fazendo o lustre da sala tremer inteiro, enquanto as crianças sentadas à mesa de boca cheia tampavam os ouvidos com as mãos. Minha tia-avó chorava emocionada com o filho cantor. O discurso do vô, que ninguém ouvia assim todo domingo, ameaçava se suicidar com a faca do pão. Enquanto uns molhando o pão no copo de vinho, todos falavam juntos palavras em italiano. Tudo era interrompido sempre pela vovó, com o seu vestido de domingo envolto num avental improvisado, gritando: – “Olha as brachola!”, seguida com a voz sacra de fundo do primo cantor, achando que as palmas eram para ele, agradecia e chorava emocionado. 

Esses almoços começavam logo após o café da manhã entre os salames, o bule de café e pão.Meu pai no centro da mesa, portas abertas para a rua e da “finestra” da sala avistava-se o bairro do Bixiga. Primo que eu não conhecia no ano passado, minha tia Adélia que vivia grávida apresentava orgulhosa a nova prole. Travessas de comidas chegando e gente, gente que não acabava mais.

Assim o dia ficava noite que se encerrava com um capeletti ao brodo e pudim de pão, ainda alguns permaneciam desde manhã cedo na mesa falando e rindo um do outro sem parar. 

Aprendi a guardar esses dias num lugar dentro de mim, assim como nossos gordinhos de bochechas rosadas, esses alegres homens do passado.

Na lembrança protegida pela minha saudade, fica esse senhor, meu velho, sempre com um terninho elegante e surrado, parado na esquina fumando um charuto baiano Suerdick, sorriso nos lábios, relógio batacão no bolso e cumprimentando a cada um que passava, conhecido ou não.

Findo a crônica, alcanço a rua e saio assobiando: “Naquela mesa tá faltando ele e a saudade dele tá doendo em mim”…

Por Pedro Costa

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