Referência nacional quando se fala em dança e coreografia, Carlinhos de Jesus é o típico carioca que nesta entrevista mostra que também tem um lado paulistano. “Ôrra, meu!”
A dança, segundo Carlinhos de Jesus, “faz parte da minha vida desde os quatro anos de idade. Meus pais sempre promoviam festas em casa e eu cresci em meio a elas”, conta ele. E essa ligação com a dança dura desde então. “Hoje, com 63 anos, e graças à dança, tenho disposição física para levar a vida e trabalhar muito”, diz.
Dançar para ele é trabalho. Ele é dono de academias de danças que levam seu nome no Rio de Janeiro e em Guarulhos, em São Paulo. Nelas, os ritmos populares, como samba, gafieira, zouk, forró e outros mais, são ensinados. “Dançar é uma atividade completa. Ela traz benefícios físicos e psicológicos, previne doenças e melhora a qualidade da pele”, garante ele. “E pode ser praticada por qualquer pessoa em qualquer idade da vida. Para dançar não é preciso ter nenhum pré-requisito. Além de ser ótimo para a socialização das pessoas.” Alguns dos professores que trabalham nas suas academias também o acompanham em apresentações pelo Brasil e pelo exterior, “onde faço questão de dançar os ritmos brasileiros. Me orgulho de levar para outros públicos os ritmos do Brasil!”, afirma com ênfase!
Viajar é uma das suas paixões tanto para mostrar sua arte como aprender. “Seja no Brasil ou no exterior, quando chego às cidades, quero conhecer outros tipos de dança e a culinária local. No Pará, por exemplo, quero comer comidas típicas e ver grupos de dança de carimbó, que é uma dança linda e cheia de colorido. E nosso país é muito rico nessa arte popular. Falta aos brasileiros conhecer mais.”
Os inúmeros prêmios que ganhou em sua carreira dão uma pequena mostra do seu talento e reconhecimento. Entre eles, Carlinhos de Jesus destaca o primeiro Estandarte de Ouro, que ganhou em 1985 como passista, desfilando pela escola de samba da Mangueira, “minha escola de coração, além do Flamengo no Rio e Corinthians em São Paulo”, revela. “Eu era jovem e, naquele ano, outros grandes passistas estavam na disputa. Foi muito importante na minha carreira. E outro prêmio que destaco é o que ganhei da Unesco como profissional da dança. Mas não posso me esquecer do prêmio de Honra ao Mérito que ganhei em São Paulo. Na verdade, todos esses prêmios eu recebo como um reconhecimento à arte popular da dança, que me dá muito orgulho.”
Carnaval está no DNA do Carlinhos, seja como passista ou como coreógrafo de comissões de frente de escolas como a sua querida Mangueira e Beija-Flor, no Rio de Janeiro, em memoráveis desfiles. Mas este ano, Carlinhos vai para o outro lado do balcão. “No Rio, não vou desfilar em nenhuma das escolas. O motivo é que vou ser jurado do Estandarte de Ouro e preciso ser o mais neutro possível. E vai ser difícil ficar longe da pista!”
Mas ele não ficará fora dos desfiles graças ao convite da escola de samba Pérola Negra, da Vila Madalena, que este ano terá a dança como enredo. “Será o meu primeiro desfile em São Paulo e o único que farei neste carnaval. Muito me honrou o convite feito pelos amigos da Pérola Negra. Vou desfilar no carro representando a gafieira. Vai ser lindo!”
No dia seguinte ao desfile da Pérola Negra, Carlinhos de Jesus comanda, desde 1991, o bloco carnavalesco “Dois para cá, Dois para lá”, que inicia o desfile pelas ruas do bairro de Botafogo e termina em Copacabana. “Entre os mais de 4 mil integrantes, todo ano recebemos muitos paulistas de Santos e do interior, além dos paulistanos. Isso mostra a interação entre as duas cidades, que têm estilos próprios mas gostam de participar da maior festa popular do mundo: o carnaval!” Ele até cogita criar uma versão paulistana do seu bloco. “Mas tem que ser na Vila Madalena, é claro.”
Carlinhos lembra que tem uma ligação bem próxima com São Paulo. “Nas minhas férias escolares, eu ficava contando os dias para vir até a casa de um tio que ainda mora na zona leste. Também andava pela Mooca, Bosque da Saúde e Cambuci. Tenho fotos de menino no Monumento às Bandeiras (Ibirapuera). Era muito divertido! Hoje, como venho com regularidade à São Paulo, fiz questão de manter meu apartamento na Pompeia. Tenho aqui a Casa de Danças, o Lapa 40 Graus, e sempre sou convidado para shows e palestras”, conta.
“A versão paulistana do Lapa 40 Graus precisava ser na Vila Madalena”, afirma ele que, junto com sócios, inaugurou a casa em julho de 2014. “A Vila lembra bairros boêmios famosos, como o Village em Nova York e a Lapa no Rio de Janeiro. Essa mistura de moradores e boêmia é muito boa para a cidade e no Lapa 40 Graus temos uma programação eclética e bem brasileira, com todos os estilos – sambalanço, samba, gafieira, MPB – com artistas conhecidos como Jorge Aragão, Maria Rita e jovens como João Sabiá ou o grupo Sambô. Nossa música e cultura são muito ricas. Sinto que Rio e São Paulo têm características regionais próprias. Mas a música envolve as pessoas e ela pode estar tanto lá como cá. E a Vila Madalena tem um universo de dança e música que me agrada muito.”
Dono de uma alegria contagiante, Carlinhos de Jesus só tira o sorriso do rosto ao lembrar da morte prematura do filho Carlos Eduardo de Jesus, o Dudu de Jesus, que trilhava carreira de cantor e morreu assassinado em 2011. “Eu estava em Caxias do Sul me apresentando quando soube da morte trágica dele. Ele era um garoto que vivia intensamente e talvez por isso tenha ido embora tão cedo. Não tem explicação a dor que a gente, que como pai, sente ao perder um filho. Sofri muito quando meu pai e minha mãe morreram, mas perder o filho, ainda dói e é um vazio que não se preenche. Só com a união da família e o apoio dos amigos e a fé em Deus, que é minha bengala, meu divã, que dá para levar a vida adiante”.
Essas experiências e outras ele pretende colocar em um segundo livro. O primeiro, Vem dançar comigo, foi lançado em 2005, na Bienal do Livro. Quando convidado para dar palestras para motivar as pessoas, ele encerra suas apresentações convidando todos para dançar. Tem jeito melhor? (GA)
Lapa 40 Graus São Paulo
Rua Inácio Pereira da Rocha, 520, Vila Madalena
Telefone 3097-0095