Nunca mais soviético no samba

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É impossível não sentir a presença do carnaval. Não há recolhimento que afaste você desse bunski-bum constante. Nem na praia, nem no campo, nem em qualquer canto do País, melhor dizendo, do mundo, porque há uma inegável tendência a sua internacionalização, que lhe abrigue os ouvidos. Pode ser que esteja no sangue, explicação tão usada pelos sambistas, e aí não tem como. Mas, fisicamente, sinto um efeito impactante.
Nunca fui um folião sequer, porém jamais deixei de observar essa movimentação como uma força que desorganiza o cosmo cotidiano. Que refaz contatos com referências culturais predominantemente negras. Que discute as relações humanas, o homem e a mulher, a sexualidade, portanto. Enfim, um monte de coisas. Certa vez estava no Xingu durante este período, e fiz um carnaval no posto Leonardo, improvisando alguns instrumentos, panelas, baldes e latas, e o resultado foi frenético. Daí a pouco os índios estavam carregando cadeiras, galhos de árvores e tudo que tinham pela frente. Neste momento o nosso desfile parecia mais um “pariat”, que é uma aldeia visitando as outras para divulgar a sua festa. Portanto, essa manifestação transcende a tudo isso. E só assim se pode compreender o interesse de povos distantes por esse evento.
Quando voltávamos da pelada na USP, fazíamos um samba-de-roda no balcão do Sujinho. E tinha gente de peso. O Miranda, Dinho Nascimento, Urano e muitos outros, todos relembrando canções de nossa infância, com batuque, cervejas e tudo mais. Num dado instante alguém errava o breque e as gargalhadas surgiam no comentário: “Tem soviético no samba”. Essa é a única coisa que não acontecerá pelo simples fato de não haver mais a União Soviética. Porque este ano, no bicampeonato da Império da Casa Verde, o mestre-sala da escola era um japonês, com apenas um ano de Brasil. O que quer dizer que ele aprendeu todos os salamaleques no Japão.
Sempre terá alguém para explicar tudo. Mesmo isso. “É que a imigração japonesa faz 100 anos”, comenta um explicador qualquer, mas sem convencer. Senão como explicar esse enorme contingente de estrangeiros em Salvador, em Olinda, no Rio e em São Paulo. Às vezes organizados em alas nos blocos e também em iniciativas individuais.
É claro que a parte mais importante está aqui mesmo. Na alegria que traz a nossa gente brasileira. Na afirmação do carnaval paulista. E o mais importante de tudo é que a Pérola Negra subiu para o primeiro grupo. Viva a turma da Pérola. O resto é que nunca mais teremos soviético no samba.

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