Entre o burro e o homem

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Desde sempre ouvi dos mais velhos que os valores culturais eram imbatíveis mesmo diante da certeza científica. Nunca tirei a prova dos nove, nem me preocupei muito com isso.
Porém, quando penso no tratamento nada compatível dado à futurologia aqui no nosso País, começo a crer que os antigos tinham razão. É cultural misturar futurologia com búzios, baralhos, simpatias e adivinhações em geral. E o que é pior: nunca tivemos interesse em desfazer esse entendimento.
O único futurólogo de que tenho notícias foi um americano que passou no Brasil na década de 1960, chamado Hermann Khan, que previu seca para o Rio Grande do Sul, caso fossem desmatados o Sul da Bahia e Norte do Espírito Santo. Claro, reagimos ironicamente como fazemos com Robério de Ogum e outros, apenas acrescentando as delicadas particularidades do personagem “americano gordo e chato”. No entanto, antes da virada do milênio, tudo se confirmou tal como ele previu.
Estamos vivendo a expectativa da volta às aulas. Todos sabemos as dificuldades que teremos, tanto no trânsito quanto na violência. Enfim, São Paulo volta à sua realidade absurda, porque no mês de janeiro exportamos temporariamente dois milhões de automóveis e com eles os assaltantes e todas a mazelas.
Por que não é sempre assim? Essa pergunta não tem o menor cabimento. Todos sabemos. Mas o que é intrigante é a ausência de qualquer projeto para sairmos desse buraco.
Chegou às minhas mãos, através de minha irmã Iege, um livro de fotos antigas de Sampa. As primeiras datam de 1860. Não tive a menor dúvida e embarquei na cidade. São Bento, Direita, Páteo do Colégio, todas lotadas de burros com selas, ou charretes, ou mesmo bondes puxados por burros. A dedução era inevitável. O mundo devia cheirar a cocô de cavalo à beça. Perguntei aos amigos Alessandro e Vângela o que era melhor. Alê, engajasíssimo, disse logo: “Antigamente era material orgânico. “Vanja”, contrariamente, prefere o caos de hoje. Porém, nenhum deles arriscou qualquer prognóstico para o futuro.
Durante um longo engarrafamento que enfrentamos no ano passado, Patrícia exercitou uma saída: “Lembra-se daquela cadeira voadora que o Joãozinho Trinta trouxe da Nasa para o sambódromo? Pois é. Será aquele o novo transporte”. Não sei se ela é cartomante ou futuróloga, mas não gostei da idéia de ser um homem-abelha.

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