Negócios da China

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Pedestres e motoristas paravam, diminuíam a marcha diante do consulado chinês em São Paulo, no dia 13 de fevereiro, para ler os cartazes e panfletos distribuídos pelos ativistas da proteção animal. O protesto contra o uso de peles, simultâneo a cerca de trinta outras cidades do resto do mundo, alcançava seu objetivo de informar. A China é um dos maiores fabricantes de artigos à base de peles de animais. Embora a forma atroz com que os animais são abatidos seja semelhante ao que ocorre em outros países considerados “civilizados” no trato com outras espécies. As baleias e focas dos países nórdicos bem o sabem. Na Suíça, Alemanha e Canadá, sedes dos maiores fabricantes de medicamentos, ardem outros infernos de animais. São os laboratórios de experimentação científica”. O que o animal racional (racional até que ponto?) não faz com os ditos irracionais em nome de seu prazer e conveniência? Fabricar remédios é um “negócio da China”. Mas literalmente falando, os negócios da China estão começando a incomodar a espécie humana de outros países. Não à toa, a manifestação do dia 13 recebeu aplausos de passantes.
No artigo com um título-trocadilho, “Os Preçonhentos”, Luciano Pires – um jornalista que agita idéias através do seu site www.lucianopires.com. br – chamou a atenção de forma sucinta porém aguda, para as conseqüências dos negócios da China. Lá seus operários trabalham por um terço do salário dos operários brasileiros, fabricando um produto com qualidade equivalente, numa escala 40 vezes maior. Assimilam e lançam um novo produto em questão de semanas. Evidentemente o custo e o preço deste produto é uma fração de um similar nosso. O articulista diz: “Essa é a armadilha chinesa. Que não é uma estratégia comercial, mas de poder. Os chineses estão tirando proveito da atitude dos marqueteiros ocidentais, que preferem terceirizar a produção e ficar com o que “agrega valor”: a marca”. Os empresários estrangeiros ganham fortunas no curto prazo comprando baratinho dos chineses e revendendo pelos dólares que a grife chic pode impor. Mas ele prevê: “Enquanto os ocidentais terceirizam as táticas e ganham no curto prazo, a China assimila as táticas para dominar no longo prazo. As grandes potências mercadológicas que fiquem com as marcas, o design… Os chineses ficarão com a produção, desmantelando aos poucos os parques industriais ocidentais”. Então a China ditará os preços de mercado. E L. Pires conclui: “Nesse dia, os executivos “preçonhentos” tristemente olharão para os esqueletos de suas antigas fábricas, para os técnicos aposentados jogando bocha na esquina, para as sucatas de seus parques fabris desmontados. E então, entristecidos, abrirão suas marmitas e almoçarão suas marcas.”
Assim, parece que a História nos pregará uma peça: a ex-China comunista não exportou pro restante do mundo a ditadura do proletariado, mas derrotará o sistema capitalista utilizando a semi-escravidão do seu operariado, parente daquela dos primórdios da era industrial, a qual provocaria o surgimento da filosofia marxista. Empresários falidos e operários sem trabalho do Ocidente finalmente comerão do mesmo cardápio? E o que já provoca a enorme rede da falsificação que rende 540 bilhões por ano, conforme a Organização Mundial das Aduanas? Sabe-se que atualmente um falsificador pode ganhar tanto quanto um traficante de cocaína. E não ignoramos de onde vem a maioria dos produtos de grifes falsificadas. Afinal, a terceirização na Ásia permite que lá a cópia seja melhor executada: o processo de execução se desnuda diante de milhões de olhinhos amendoados.
Mas o olhar, oriental ou ocidental, não vê o que há mais além das questões de mercado: a semelhança das injustiças perenemente praticadas pela humanidade contra os mais fracos. A exploração do homem pelo homem gerou uma filosofia na segunda metade do século XIX. Outra vem surgindo aos poucos, brotando nos dois séculos mais recentes e, possivelmente, florescerá no segundo milênio: o pensar mais profundo sobre o respeito que devemos à integridade, manutenção, ao bem-estar e à vida das outras espécies. Será uma revolução de consciência que bem poderá começar pelo consumo: não comprar um produto mais barato à custa de salário vil; não pagar o aparente preço alto por uma pele, ínfimo diante da enorme dor de um animal despelado vivo, pra que seu antigo invólucro permaneça inteiro – e valioso – após sua morte.

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