Horror na Djalma Coelho

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Época de Natal, triste, a moça veio me contar: um cachorro na sua rua fora atropelado. Diante da minha expressão de lástima, completou: “Isso não é nada diante do que o dono fez logo depois com o cachorro”. Por um instante imaginei o que de pior poderia acontecer. Os vizinhos já tinham avisado ao veterinário que mora perto do que havia acontecido. Ele chegara há pouco do trabalho e se preparava para socorrer o animal ferido, a pedido dos moradores da rua. Entre revoltada e chorando a moça então contou que, enquanto isso, o dono ao ver o cachorro naquele estado, o matara a pauladas dentro de casa, enquanto gritava “quem mandou você ir pra rua?!”. Os filhos em casa. Se não assistiram, ouviram os gritos do pai e do animal.
A vizinhança, revoltada, chamou a polícia que alegou não poder entrar na casa para prender o dono do cão em flagrante. Diante disso o veterinário dirigiu-se ao distrito policial de Pinheiros para que fosse lavrado o boletim de ocorrência. Fez o que um cidadão consciente deve fazer num caso como este. E os vizinhos esperam que o delegado cumpra a sua parte: instaure inquérito para que o provável criminoso seja punido, de acordo com a Lei 9.605/98, Capítulo V, Seção I, artigo 32. A lei é clara: é crime “praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos”. Pena para quem a viola: três meses a um ano de prisão e multa. (A multa é cumulativa à detenção). “Incorre nas mesmas penas quem realiza experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos”. E mais “A pena é aumentada de um sexto a um terço, se ocorre a morte do animal”.
À parte considerações de ordem moral e emocional, também é ilegal (e perigoso) soltar animais na rua. As legislações municipais exigem que os cães sejam conduzidos com guia e coleira nas vias públicas, por pessoa que possa contê-los. É condenável ver pessoas passearem com seus cães soltos, até mesmo empurrando carrinhos de bebê pelas calçadas. Basta passar uma cadela no cio, um outro cão que provoque briga, queima de fogos em dias de jogos ou reveillon, e os donos irresponsáveis verão onde começa e termina a eficiência do adestramento. Quantas histórias de acidentes fatais tenho ouvido de donos chorosos por conta dessa prática…
Quanto às questões de ordem ética, este caso da rua Djalma Coelho nos leva, mais uma vez, a algumas correlações. Ontem mesmo o Presidente da República declarava sua intenção de fazer com que determinados crimes sejam classificados como hediondos, acarretando penas mais rigorosas para quem os comete. Tem toda razão. Atear fogo num ônibus com passageiros naturalmente horroriza qualquer pessoa de bem. Mas o que nos admira é quão pouQuanto às questões de ordem ética, este caso da rua Djalma Coelho nos leva, mais uma vez, a algumas correlações. Ontem mesmo o Presidente da República declarava sua intenção de fazer com que determinados crimes sejam classificados como hediondos, acarretando penas mais rigorosas para quem os comete. Tem toda razão. Atear fogo num ônibus com passageiros naturalmente horroriza qualquer pessoa de bem. Mas o que nos admira é quão poucas pessoas de bem se indignem e ajam, principalmente ajam, diante de crimes hediondos contra animais. E eles acontecem todos os dias, às centenas, sem que as chamadas pessoas de bem tomem a iniciativa de, sequer, ir à delegacia mais próxima prestar uma queixa. E menos ainda acompanhar o processo para que o inquérito prossiga até o devido fim. Mesmo em caso de crime hediondo contra um bicho. Há uma mentalidade ou sentimento difuso de que um animal irracional não sofre, ou sofre menos que um racional. Sofrimento não é questão de razão. É questão de sensação. Se assim não fosse, seria menos condenável impingir sofrimento aos loucos ou aos débeis mentais. Para sentir, basta que a criatura possua órgãos de sentidos e um sistema nervoso. Enfim, seja uma criatura senciente. E os animais também o são. Quem os observa e convive com eles percebem isso melhor.
O provável criminoso da rua Djalma Coelho, sabe-se, tem uma pequena deficiência física. Se há quem possa atribuir a isso o seu ato diante do animal atropelado, também poderíamos cobrar dele uma atitude mais humanitária e solidária para com seu animal ferido. Sob o ponto de vista humano, a empatia de quem sofre por um outro sofredor deveria ser natural. A empatia e a solidariedade são atributos do ser humano. Qualidades também encontradas entre os primatas, é bom lembrar. Porém que tipo de criatura mata de forma dolorosa uma outra, gravemente ferida, tendo os filhos como testemunhas? As crianças rejeitarão o pai, ou o imitarão?

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